Não sabia dizer ao certo o que sentia. Na verdade, se
tivesse que dar nome àquela sensação seria algo próximo a “necessidade”. Não
era vontade, disso ele tinha certeza. Era uma urgência em vê-la, em visitá-la,
em entregar-se de corpo e alma. E havia começado do nada, como uma fagulha que
incendeia um monte de palha. Começou como um leve farfalhar de asas de uma
borboleta, aquela sensação incômoda no estômago. Mal sabia ele que aquele breve
momento se tornaria algo tão intenso e profundo. Passou a tarde inteira no
escritório com um único pensamento na cabeça – precisava vê-la. Duas horas,
três horas, quatro horas, a cada tiquetaquear do relógio o tempo parecia se
arrastar ainda mais. Nunca havia sentido algo parecido, e ia além: duvidava que
qualquer ser vivente tivesse sentido algo como aquilo. Quatro horas e quarenta
minutos, quatro horas e quarenta e cinco minutos. Os repetidos cafés só faziam
piorar. A luz fluorescente do ambiente apático acentuava sua palidez quase que
cadavérica. Suava frio, se retorcia incômodo na cadeira. Poderia remediar a
situação ali no escritório mesmo, mas sentia que aquilo merecia um momento
único, especial. Afrouxou o nó na gravata, tirou o paletó, arregaçou as mangas
da camisa, diminuiu a temperatura do ar condicionado. Nada funcionava, nada o
impedia de pensar nela como a única coisa no mundo que poderia salvá-lo. Precisava
dela como os peixes precisam da água. Não era mais um sentimento qualquer, era
algo atrelado à própria sobrevivência. Cinco horas, cinco horas e dez minutos,
os relatórios ficaram esquecidos em meio a copos de café e genuína angústia. O
desespero começava a tomar conta daquele corpo cansado de tanto lutar. Cinco
horas e quarenta e oito minutos e os tiques e taques do ponteiro dos segundos
pareciam encantados para contar o tempo da maneira mais lenta possível. Tique,
taque, tique, taque e o suor frio escorria pelas têmporas e o cérebro parecia
derreter-se aos poucos. A gravata, já de lado, testemunhava a lenta decadência
de um homem desesperado. Tique, taque. Seis horas. Mal teve tempo de pegar a
maleta e já disparava em direção ao estacionamento. O carro parecia uma
gigantesca gaiola de metal que o separava dela. O trânsito parecia imóvel, os
sinaleiros demoravam horas para abrir, os motoristas pareciam ter resolvido
andar na metade da velocidade normal. Depois de minutos que pareceram dias
finalmente embicava na rua de casa. As mãos trêmulas, a visão embaçada, resolveu
deixar o carro na rua. Acionou o alarme e correu em direção à porta, as pernas
bambas de tanta ansiedade. Nem disse boa noite ao porteiro, apertou convulsivamente
o botão do elevador. Começava a se arrepender por ter comprado um apartamento
no sétimo andar. Um, dois, três andares e só tinha um pensamento na cabeça:
ela. Abriu desesperado a porta do apartamento e nem se deu ao trabalho de
trancá-la. Jogou o paletó na mesa da cozinha, a maleta no sofá e, derrapando
pelo corredor, despia as calças, restando apenas as meias brancas e a cueca.
Finalmente, pensava ele, sorrindo de orelha a orelha. Agora era a hora.
Depois de um dia de desespero e agonia, entrou sorrindo no
aposento, acionando o interruptor. A luz branca banhou o cômodo. E de repente o
mundo parecia muito mais bonito. E, rindo da sua própria condição deplorável,
jurava que nunca mais comeria naquele restaurante de novo. Tirou a cueca,
apanhou uma revista qualquer e caminhou triunfante.
Lá estava ela.
A sua privada.
(Lucas Panzarini)
(Lucas Panzarini)