E afinal, por quem os sinos dobram?
Não por mim. Jamais por
mim. Os sinos batem, badalam, cantam cantigas e o meu réquiem. Me
consomem a alma, me destroem a cabeça, me enchem a mente de gongadas
eternas perdidas em lufadas de vento e fumaça e cheiro de gasolina.
Dies irae, dies ille.
Um dia, dois dias e a loucura e o desespero e o asfalto. O asfalto,
sempre o asfalto. A mãe que acolhe os vagabundos, os errantes, os
desiludidos e os mortos em vida. E o ódio que consome é o ódio que
consola. E a faísca de esperança que morre a cada cigarro aceso na chama
que consome o que ainda existe, o que ainda insiste, o que todas as
noites pensa em morrer mas não se vai. E no fim o que resta é o medo.
Que nada mais é do que o amor pintado de preto. E o coração, vermelho
sangue, se parte em dois e se divide e se contorce enquanto busca no
cérebro um fundo de razão que já não mais existe porque foi substituído
por todo o álcool que eu consumi desde que eu só enxergava os cabelos
longos caindo pelas costas e a porta do trem se fechando e então a
paisagem morta da estação habitada por todas as minhas dúvidas.
E
um sopro dispersa os limites da lareira enquanto Rimbaud se contorce em
sua essência por ver a sua obra usada pra fim nenhum por um ninguém que
sequer sabe falar francês.
(Lucas Panzarini)